CAN ANGOLA-2010 - Uma vez Faraó… sempre Sua Majestade!
CAIRO, Alexandria, Ismailia, Port Said, Suez e outras grandes e pequenas cidades do Egipto dormiram acordadas ontem à noite.
O motivo não podia ser outro: festejar exuberantemente a conquista, pela terceira vez consecutiva, do título continental de futebol. A 27ª edição do Campeonato Africano das Nações Angola-2010, que terminou em beleza e em ambiente colorido e indescritível no Estádio 11 de Novembro, em Luanda, viu os “Faraós” subirem novamente ao pedestal de honra, mercê do triunfo na magnífica final com o Gana por 1-0.
O solitário e vitorioso tento teve a assinatura de Gedo, aos 85 minutos, na sequência de uma primorosa combinação com Zidan, pelo lado esquerdo. Já na grande área e vendo a saída precipitada do guarda-redes Kingson para diminuir o ângulo, o considerado suplente dourado, em virtude de sempre sair do banco para marcar, rematou com a parte interna do pé direito, colocando o esférico para uma zona de difícil alcance para o “keeper” ganês.
Era o momento mais sublime da partida e também de verdadeiro contraste: os “Faraós”, que nessa altura até vinham sofrendo uma forte pressão por parte do adversário, iniciavam uma inequívoca festa, tendo em conta que dificilmente o Gana poderia chegar à igualdade e forçar o prolongamento; e as “Estrelas Negras”, que então brilhavam nos céus luandenses, viam uma seta venenosa espetar-se impiedosamente no seu peito, deitando-se abaixo todo o seu rosado castelo que estava sendo construindo, sobretudo pela forma como se estavam exibindo no segundo tempo da contenda.
Este desafio, sem ter sido uma final de sonho, não deixou de ser espectacular e disputada com todo o ardor pelos artistas das duas formações. O futebol pragmático dos egípcios encontrou ontem um opositor à altura de detê-lo, daí as imensas dificuldades que os seus intérpretes tiveram para explaná-lo.
Com uma defesa bastante compacta, os ganeses não ofereceram espaço de manobra aos matreiros e perspicazes Meteeb e Zidan, nem tão pouco ao “play-maker” Ahmed Hassan para armar o jogo ofensivo da sua equipa.
O mago Hassan Shehata, o técnico fortemente contestado quando passou a dirigir a equipa e hoje venerado por “todo o mundo”, ensaiou várias mutações de ordem táctica, na perspectiva de furar a estratégia adversária, que consistia numa linha intermediária bastante pressionante e uma retaguarda sem contemplações, no entanto, sem sucesso, acabando por chegar às mãos de Kingson bolas praticamente mortas.
Mas, também com um meio-campo muito povoado, através da colocação de quatro a cinco homens, o Egipto também não permitiu veleidades aos ganeses, mesmo com o grande tecnicismo demonstrado por Asamoah Gyan, autor de vários remates susceptíveis de golo, bem secundado pelo incansável André Ayew, um verdadeiro quebra-cabeças para a defesa afro-árabe.
INFALÍVEL GEDO
Na etapa complementar da partida, se os egípcios detinham a maior posse de bola, era o Gana, entretanto, que mais se aproximava do golo, mercê do seu claro domínio na zona nevrálgica e numa altura em que se jogava a uma velocidade alucinante, principalmente por parte das “Estrelas Negras”, a tirar partido de uma certa exaustão dos “Faraós”.
Só que, ao que tudo indica, Hassan Shehata tem substituições imprescindíveis e que normalmente têm um efeito positivo: lançou Abdelshafi e Gedo, duas unidades bem dotadas tecnicamente e desequilibradoras. E a sua acção não se fez esperar, pois o Egipto recuperou algum espaço que havia perdido a favor do Gana, para além do momento fatal ocorrido aos 85 minutos.
A combinação entre Gedo e Zidan é magnífica, principalmente pela inteligência evidenciada por Gedo, que apenas precisou do seu colega para servir de tabela, isto é, foi ele que iniciou o lance, fez o passe para Zidan e este, prontamente, devolveu o esférico ao suplente dourado, baralhando por completo a defesa ganesa.
Com o difícil praticamente feito, já na área foi somente colocar a bola no melhor sítio, para gáudio dos egípcios, que dessa forma construíam o golo que lhes levaria ao pedestal de honra pela terceira vez consecutiva e pela sétima no seu historial.
Com o tento a surgir no momento de maior inspiração das “Estrelas Negras”, apesar do evidente conformismo de ambas as partes, projectando os 30 minutos suplementares, o Gana ainda teve tempo e espaço para protagonizar um lance que poderia ter produzido o empate e, consequentemente, o prolongamento, porém, sem êxito. O último apito do árbitro só veio confirmar a já iniciada festa rija dos egípcios, unanimemente considerados a melhor e mais forte selecção presente no CAN Angola-2010.
INVENCÍVEIS
Únicos invictos na prova, os “Faraós”, adstritos ao Grupo “C”, em Benguela, ganharam, na primeira fase, sucessivamente à Nigéria (3-1), Moçambique (2-0) e Benin (2-0). Na etapa subsequente, a sua senda vitoriosa continuou diante dos Camarões (3-1), nos quartos-de-final, Argélia (4-0), nas meias-finais, e ontem, perante o Gana (1-0), na final. Tendo marcado 15 golos em seis partidas, cinco das quais disputadas em Benguela, os egípcios apenas sofreram dois tentos, curiosamente em desafios em que, tendo visto a Nigéria e os Camarões se adiantarem no marcador, acabaram por efectuar um magnífico volte-face, vencendo pelo mesmo “score” de 3-1.
Na sua extraordinária e espectacular caminhada, Egipto enfrentou quatro selecções apuradas para o Campeonato do Mundo África do Sul-2010: Nigéria, Camarões, Argélia e Gana, sempre se saindo com sucesso e demonstrando que também merecia um lugar nessa grandiosa competição. Aliás, o embate das meias-finais, frente à rival Argélia e seu “carrasco” nas eliminatórias para o “Mundial”, serviu claramente como uma vingança e demonstração de forças, zombando o adversário com uma goleada por 4-0, o desfecho mais desnivelado nesta prova.
Nas duas edições anteriores, designadamente Egiopto-2006 e Gana-2008, os “Faraós” bateram na final a Costa do Marfim por 4-2, após o desempate através de pontapés da marca de grande penalidade, na sequência do nulo ao cabo dos 120 minutos, e os Camarões por uma bola sem resposta, respectivamente.
Os outros quatro títulos foram ganhos na primeira edição, em 1957, no Sudão, com vitória sobre Etiópia pela marca de 4-0; na segunda, em 1959, no Egipto, mercê do 2-1 diante do Sudão; na décima quinta, em 1986, novamente mo Egipto, ao bater Camarões por 5-4, por penates, depois do 0-0; e na vigésima sétima, em 1998, no Burkina Faso, com triunfo perante a África do Sul por 2-0.
Ontem, coube ao capitão Ahmed Hassan receber o troféu de campeão africano das mãos do Chefe do Estado angolano, José Eduardo dos Santos, nesta cerimónia acompanhado pelos presidentes da FIFA, Sepp Blatter, e da CAF, Issa Hayatou.
Ahmed Hassan, 36 anos, foi galardoado com o título de melhor jogador do CAN Angola-2010, no epílogo de uma brilhante carreira e com mais de uma centena de internacionalizações. O seu colega da baliza, El-Hadary, foi eleito melhor guarda-redes, enquanto Gedo, 25 anos, foi o melhor marcador da prova com cinco golos e igualmente considerado jogador revelação.
Especificamente em relação à final, Fathy foi o homem do jogo – já o havia sido frente a Moçambique – e Asamoah o jogador “fair-play”.
Com o espectacular fogo-de-artifício a encerrar a 27ª edição do Campeonato Africano das Nações Angola-2010, ainda houve espaço para a passagem do testemunho, com a entrega da bandeira da competição aos responsáveis do próximo CAN, em 2012, co-organizado pelo Gabão e pela Guiné-Equatorial.